Quadro nosológico que apresenta um padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade/impulsividade e que interfere em áreas importantes do funcionamento (escola, casa, hobbies, autoestima, social, laboral).
O que é a Perturbação de Hiperatividade com Défice de Atenção (PHDA)?
A PHDA é uma perturbação do neurodesenvolvimento, portanto, com idade de início na infância. Foi descrita a primeira vez na literatura médica em 1700. É mais frequente em rapazes do que raparigas. Frequentemente, persiste em idade adulta. Existe uma predisposição genética e fatores de risco ambientais que estão na origem desta perturbação.
Do ponto de vista neurobiológico, verificam-se alterações no córtex pré-frontal, frontal, gânglios da base e cerebelo que estão implicados na patofisiologia da PHDA. Há, portanto, uma alteração normal da neurotransmissão em pessoas com PHDA, sobretudo das vias dopaminérgicas. Doentes com PHDA demonstram dificuldades na tomada de decisão, coordenação psicomotora, atenção, memória de trabalho e funções executivas.
Qual a fronteira entre o normal e o patológico na desatenção e na hiperatividade?
Em qualquer problema de saúde mental existem 3 critérios que separam a linha entre o normal e o disfuncional:
- duração dos sintomas no tempo
- frequência dos sintomas e intensidade dos mesmos
- impacto da sintomatologia em diferentes e importantes áreas do funcionamento.
Pode uma criança apresentar défice de atenção sem hiperatividade? Ou o inverso?
Sim. Quando se faz o diagnóstico de PHDA o clínico tem de identificar um dos 3 subtipos de diagnostico da perturbação: predominantemente desatento (sem hiperativiadade/impulsividade); hiperativo/impulsivo (sem défice de atenção) ou combinado (desatento e hiperativo/impulsivo).
Quais são os principais fatores de risco para o desenvolvimento da Perturbação de Hiperatividade com Défice de Atenção?
Uso de álcool e /ou nicotina durante a gravidez estão associados ao desenvolvimento de PHDA. Muitas crianças com PHDA nasceram prematuras ou tiveram baixo peso à nascença. Sofrimento à nascença. Familiares diretos com PHDA e défices nutricionais estão associados também ao desenvolvimento de PHDA
Quais os principais sintomas e sinais da PHDA?
Procrastinação, dificuldade em manter o foco em atividades ou tarefas que não sejam interessantes, ausências de pensamento “sonhar acorado”, dificuldade em voltar a focar, multitasking, múltiplas ideias sem concretização, dificuldades na organização e execução de tarefas com adiamento, cansaço físico, sonolência diurna, agitação interior, irritabilidade, labilidade emocional, dificuldades na autorregulação, hiperatividade motora, dificuldade em esperar pela sua vez, impulsividade, dificuldade em antever consequências fruto do impulso, dificuldade em tomar decisões, indecisão geral, baixa autoestima, descuido com os objetos, necessidade de pausas e de se mover, necessidade de feedback constante, escutar as conversas dos outros sem intenção, abandonar conversas, relações ou objetos quando não são mais novidade.
Como se avalia e diagnostica a PHDA?
A avaliação psicológica é um processo que apenas os psicólogos o podem fazer. A avaliação consiste em recolha de informação de diferentes pessoas significativas da vida da criança, normalmente são administradas escalas validadas e aferidas para a população portuguesa aos pais e professores, com o objetivo de perceber as suas perceções acerca do comportamento e dificuldades atencionais da criança. A avaliação deve também ser com a criança com prova de QI e/ou neuropsicológicas para ser estudado o seu perfil neurocognitivo, para além da entrevista clínica e anamnese, que normalmente é colhida na primeira consulta.
Qual o melhor tratamento para PHDA?
As guidelines mundiais são claras e definem para o tratamento de PHDA psicoterapia e psicofarmacologia. Sendo uma perturbação do neurodesenvolvimento, a medicação ajuda na reorganização neural fazendo com que, sobretudo, a dopamina seja recaptada de forma mais eficaz. Assim, o cérebro fica mais organizado, neuroquimicamente, a pessoa foca mais e, consequentemente, apresenta melhor desempenho no rendimento escolar e nas relações com os outros.
Factos e desconstrução de mitos:
A pessoa com PHDA depara-se com o desejo de fazer as coisas na perfeição com a falta de vontade de o fazer e adiamento das tarefas (procastinação).
A inteligência nada tem a ver com PHDA, portanto, uma pessoa com PHDA pode ter uma inteligência média ou superior a uma pessoa sem a doença. Pode, contudo, existir diferenças num perfil de avaliação neurocognitivo em que o raciocínio numérico, a aprendizagem imediata e a manipulação inversa da informação podem estar mais afetados, justamente, pelas dificuldades na atenção e memória de trabalho.
A PHDA tem tratamento com sucesso terapêutico combinado (farmacológico e psicoterapêutico).
- Pessoas com PHDA tendem a ter hiperfoco em atividades e tarefas que são do seu interesse e pouco foco em assuntos, tarefas e atividades que não sejam do seu interesse, por isso, adiam tarefas, procrastinam e muitas vezes não as terminam.
- Pessoas com PHDA tendem a ser mais criativas, inovadoras, honestas e empáticas.
- 99% das pessoas com PHDA reportam efeitos positivos da doença.
- A pessoa com PHDA costuma ter baixa autoestima pelos comentários dos familiares, professores e pares pela sintomatologia que apresentam.
- A pessoa com PHDA tem dificuldade em se concentrar e, por isso, é injusto pedir-lhe para que esteja focada, ou seja, deve ser compreendida, avaliada e receber tratamento.
- A PHDA é uma perturbação que com tratamento melhora substancialmente. Há relatos de pessoas com PHDA que apontam para um “antes” e “depois” após receberem tratamento.
- Cada vez mais adultos procuram ajuda para avaliação e despiste de PHDA por estarem mais letrados sobre esta condição e tendo as redes sociais um papel importante na literacia fazendo com que o adulto se reveja nos sintomas de outras pessoas.
Objetivos de intervenção na consulta psicológica da criança com PHDA:
Promoção de competências psicomotoras:
- Brincar livremente de acordo com as suas motivações, capacidades e necessidades, levando a criança a respeitar progressivamente as orientações – exploração livre e observação em consulta.
- Ajudar a agir de forma focada, construtiva de modo a diminuir a necessidade de movimento e prepará-la para atividades que exijam maior concentração.
- Melhorar o autocontrolo com recurso a atividades lúdicas através de jogos de inibição de estímulos simultâneos e ajudá-la a focar na tarefa/ brincadeira.
Promoção de competências sociais:
- Desenvolver estratégias de resolução de problemas;
- Aumentar a capacidade de resistência à frustração;
- Incentivar a valorização e aceitação da opinião dos outros significativos;
- Desenvolver a ajuda e cooperação;
- Promover a participação, a integração e autonomia;
- Aprender e pedir ajuda dos outros;
Promoção de competências de autocontrolo:
- Diminuir a resistência à frustração;
- Apelar à palavra FOCO para a criança internalizar e dizer para si mesma no dia-a-dia quando reconhece já que está a desfocar;
- Diminuir os níveis de impulsividade e comportamentos agressivos com objetivo de resolver problemas de forma assertiva e construtiva;
- Promover o insight para reconhecimento de comportamentos de impulso;
- Antever consequências o que leva à consciencialização e redução do impulso;
- Promover o planeamento de atividades com foco: princípio, meio e fim, sem abandonar ta tarefa;
- Ajudar na tomada de decisão e resolução de problemas.
Promoção de estabilidade emocional e afetiva:
- Promover a expressão livre de afetos;
- Promover a perceção de autoeficácia e sentido de competência e autonomia;
- Promover autoestima e autoconfiança;
- Desenvolver a autonomia da criança.
Promoção competências de estudo:
- Aumentar o tempo de atenção da tarefa;
- Desenvolver o pensamento simbólico e capacidade de expressão;
- Promover capacidades de categorização, planeamento, organização, sequência e execução com avaliação no final da tarefa.
Como ajudar uma criança com PHDA?
- Estabelecer rotinas: as rotinas ajudam a criança a prever o que pode acontecer e isso deixa-as mais seguras.
- Os cuidadores devem utilizar pistas visuais e ir dando recados: as crianças com PHDA têm uma perceção diferente do tempo do que outras crianças sem este diagnóstico. É difícil para as crianças com PHDA terem tarefas que exijam uma atenção maior.
- As crianças com PHDA apresentam alterações funcionais no córtex frontal e pré-frontal que comanda a parte das funções executivas: muitas vezes, injustamente, chamam-lhes de “trapalhonas”, são alvo de comentários como “com mais esforço conseguias…”, “só não tira boas notas porque não queres”: não é verdade, o sentimento delas é que têm de ser elas a conseguir mas não conseguem sem ajuda porque sofrem de uma perturbação e não depende da sua vontade.
- As ordens devem ser curtas, repetidas e com referência sempre ao exterior: ela irá perder informação e aumentar a sua frustração e da dos seus cuidadores.
- As crianças com PHDA não devem ser chamadas à atenção (principalmente em público) pela inquietude, impulsividade e hiperatividade: trata-se de um distúrbio, em que a criança não consegue controlar. Por vezes, os cuidadores e os outros interpretam estes sinais como “falta de educação”. Não é.
- As crianças com PHDA têm necessidade de se levantar, pela agitação, impulsividade que sentem: necessitam de intervalos frequentes.
- As tarefas longas devem ser divididas em forma faseada.
- Utilizar a técnica autoinstução verbal (normalmente ensinado em terapia).
- Algumas crianças com PHDA recebem muita informação ao mesmo tempo, externa ou interna (através de pensamentos e fantasias) e podem ter uma hipersensibilidade aos estímulos luminosos e sonoros, pelo que se deve apelar para a parte sensorial: para, escuta e olha.
- Os cuidadores devem ser um modelo para os filhos:, não podem dizer a gritar que eles não podem gritar.
- Utilizar muito o reforço positivo, mesmo pela mais pequena coisa: as crianças com PHDA normalmente sentem a sua autoestima em baixo, pois são alvo de comentários e reparações constantes do seu comportamento.
- Sobre a medicação: a PHDA é uma perturbação do neurodesenvolvimento e tem bases biológicas, portanto, necessita de medicação em muito dos casos por alterações neuroquimícas no cérebro. Trata-se de uma doença e esta, com indicação, nunca deve ser questionada por outros familiares ou professores.
- O Psicólogo é o profissional que avalia a criança e diagnostica. O relatório psicolígico deve vir com algumas medidas curriculares ajustadas ao cérebro e perfil de cada criança para que, com as devidos ajustes curriculares, ela possa atingir o seu potencial máximo.
- O Psicólogo mantém-se disponível e em contacto com os cuidadores, professores e médicos com o objetivo único de ajudar esta criança.