A propósito do Dia Internacional do Amigo, comemorado a 30 de julho, impõe-se uma reflexão sobre o tema não só na relação que estabelecemos com o outro e a importância que adquire nas nossas vidas, como também na relação que estabelecemos connosco próprios.
Ao longo da nossa vida, o papel dos amigos (ou seja do outro) ocupa um lugar de grande destaque na edificação e estruturação da personalidade. Por exemplo, na adolescência em que através do outro se fazem movimentos de identificação que permitem ancorar aquilo que será a nossa própria identidade. No entanto, a importância dos amigos na vida do ser humano começa desde tenra idade e não tem data de expiração.
Espera-se que nas relações de amizade exista tolerância, cumplicidade, verdade, intimidade, compreensão, condescendência e perdão, mas também é sabido que o conflito, o mal-estar, a discordância e o desentendimento também fazem parte. É o balanço no equilíbrio destas diferentes partes que determina a qualidade das relações de amizade e o lugar que elas ocupam dentro de nós.
À luz da relação com os outros, a relação interna (de mim para comigo) também é feita de encontros e desencontros. E, talvez, esta seja a mais difícil e exigente relação do ser humano: a relação consigo próprio. Por vezes, esta relação é pautada pelo conflito, pela intolerância, pelo maltrato, pela incompreensão e é geradora de um profundo sofrimento psíquico expresso por sentimentos de desvalorização, falta de amor-próprio, insegurança, falta de confiança que se espelham nos diferentes contextos de vida.
Na prática clínica, podemos observar o impacto desta relação interna na vida das pessoas, uma vez que se encontra na base, quer da vivência das próprias experiências, quer nas escolhas que daí advêm. E é aí que podemos passar a ser o “nosso pior inimigo”. Quando as escolhas armadilham aquilo que poderia ser benéfico. Na sua maioria, este movimento de autossabotagem não é consciente nem percetível como tal, mas, por vezes, adquire a designação de infortúnio da vida.
Quando as pessoas nos pedem ajuda, trazem-nos muitas vezes um sofrimento inespecífico traduzido por estados depressivos e/ou ansiosos. Relatam uma incompreensão na relação consigo mesmos e sem que se apercebam pedem-nos que, enquanto psicoterapeutas, os ajudemos a fazer as pazes com eles próprios para que possam ter uma relação de amor, aceitação, perdão e tolerância.
A relação de desamor que carregam, muitas vezes diz respeito à imagem de si que vêm refletida nos outros (“de certeza que o meu chefe acha que não presto”) e também a incapacidade de construir uma narrativa valorizadora sobre si, na sua história (“sou muito fraca, não consegui dizer que não”). É na possibilidade de, em psicoterapia, encontrar novas formas de relação com elas mesmas que as pessoas poderão encontrar também uma nova forma de se relacionar com o outro e com o mundo.