A colite microscópica (CM) é uma doença inflamatória intestinal (DII) que causa diarreia crónica e aquosa (tipo água). Inicialmente considerada rara, a CM recebeu mais atenção nas últimas décadas, resultando em taxas de incidência crescentes que excedem as da DII clássica (doença de Crohn e colite ulcerosa) em alguns países, representando até 20% dos casos de diarreia crónica aquosa. O pico de incidência ocorre entre os 50 e os 70 anos e tem predomínio no sexo feminino. Felizmente, hoje em dia, é prática comum referenciar doentes com diarreia crónica para colonoscopia com realização de biópsias do cólon, pois essa é a única maneira de diagnosticar a CM (daí o termo “microscópica”). Os resultados da histologia distinguem entre os subtipos de CM – colite linfocítica e colite colagenosa.
O sintoma cardinal de diarreia aquosa pode acompanhar-se de urgência defecatória grave e incontinência fecal. Além disso, muitos doentes apresentam dor abdominal que pode ser interpretada erroneamente como síndrome do intestino irritável com predomínio de diarreia, resultando em tratamento inadequado. A CM é uma condição benigna, mas pode afetar gravemente a qualidade de vida. A associação com outras doenças autoimunes, em particular a doença celíaca, é comum.
A causa da CM permanece desconhecida, mas pensa-se que será secundária a uma resposta imunológica desregulada, em indivíduos geneticamente predispostos. Mais de 10% dos doentes têm história familiar de CM e o tabagismo também pode ter influência pelo facto de ser mais prevalente. Alguns medicamentos têm sido implicados no desenvolvimento de CM, em particular: acarbose, aspirina, anti-inflamatórios não esteroides (AINE), inibidores da bomba de protões (IBP), certos antidepressivos e ticlopidina.
A colonoscopia é o método diagnóstico de eleição, devendo sempre incluir biópsias no cólon direito e esquerdo. Classicamente, a colonoscopia não revela alterações visíveis, sendo o diagnóstico estabelecido na presença de achados típicos no exame histológico, que incluem a presença de linfocitose intraepitelial (em ambos os subtipos) e espessamento de uma banda de colagénio subepitelial (nos casos de colite colagenosa). A exclusão de outras causas de diarreia crónica é fundamental.
O primeiro passo do tratamento passa pela suspensão de medicamentos potencialmente envolvidos no processo, em particular os AINE e os IBP, e excluir doença celíaca. Se os sintomas persistirem, deve-se avançar para o tratamento farmacológico. Atualmente, o budesonido oral (um corticoide com reduzidos efeitos sistémicos) é o fármaco mais utilizado e estudado, com taxas de resposta de aproximadamente 85%. No entanto, a taxa de recorrência de cerca de 80% após suspensão do budesonido torna necessária a manutenção do mesmo, na menor dose que controle os sintomas. Nos raros casos intolerantes ou refratários ao budesonido, outros imunossupressores, como a azatioprina, podem ser utilizados.
O prognóstico da CM é favorável, não estando associada a aumento de mortalidade nem de cancro colorretal. Como tal, os objetivos da abordagem terapêutica deverão ser o controlo dos sintomas, a melhoria da qualidade de vida e a evicção de complicações.